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Geólogo e professor aposentado, trabalho este espaço como se participasse da confecção de um imenso tapete persa. Cada blogueiro e cada sitiante vai fazendo o seu pedaço. A minha parte vai contando de mim e de como vejo as coisas. Quando me afasto para ver em perspectiva, aprendo mais de mim, com todas as partes juntas. Cada detalhe é parte de um todo que se reconstitui e se metamorfoseia a cada momento do fazer. Ver, rever, refletir, fazer, pensar, mudar, fazer diferente... Não necessariamente melhor, mas diferente, para refazer e rever e refletir e... Ninguém sabe para onde isso leva, mas sei que não estou parado e que não tenho medo de colaborar com umas quadrículas na tecedura desse multifacetado tapete de incontáveis parceiros tapeceiros mundo afora.

quarta-feira, 4 de abril de 2012

Mato Grosso: o poder dos latifundiários e a subserviência do Estado (4abr2012)

Colegas do Mestrado em Política Social

Por João Romano*

Para aqueles que não me conhecem meu nome é João Romano da Silva Junior, sou delegado de polícia na cidade de Aripuanã e mestrando em Política Social turma de 2010. No nosso mestrado estudamos a questão fundiária no Brasil, e por isso gostaria de compartilhar com vocês uma experiência que corroborou algo já sabido: o poder dos latifundiários e a subserviência do Estado na consecução de interesses.

Em data de 21/03/2012 foi-me apresentado pela polícia militar um indivíduo que estava na posse de diversas armas de fogo.

Antes, contudo, é preciso constar que a prisão se deu depois que a própria policial militar representou pela busca e apreensão e deu o respectivo cumprimento. O fundamento era de que "invasores" de terra estariam armados em uma Fazenda chamada Marinepar, localizada entre os municípios de Aripuanã e Colniza, e para evitar o conflito armado era preciso agir.

Bem, se há um conflito armado pressupõe que há uma reciprocidade, isto porque, é notório que os fazendeiros lançam mão do denominados "guachebas", que são capangas armados para coibir a ação desses "invasores". Porém, apenas o presidente da associação dos assentados, em tese o líder dos "invasores" é que foi preso na posse de armas.

A prisão, segundo a PM se deu no dia 20/03 às 17 horas, mas apresentaram o indivíduo a mim somente no dia 21/03 às 22h20min (embora a demora tenha sido justifica não elide a ilegalidade da custódia), tendo havido ainda descompasso às regras constitucionais da inviolabilidade de domicílio, mesmo de posse de mandado, uma vez que é preciso observar dadas formalidades.

Diante disso, lavrei o auto de prisão em flagrante delito, e mesmo antes de encaminhar a comunicação ao Poder Judiciário promovi o seu relaxamento (conforme possibilidade que defendo em artigo publicado) e coloquei o indivíduo imediatamente em liberdade.

Até aí foi uma questão de interpretação legal, segundo minha posição de garantismo, baseado também na observância da proteção das liberdades individuais, o que não significa leniência.

O que me deixou estarrecido, embora soubesse da audácia dos detentores do poder, é que minutos depois de colocado o indivíduo em liberdade, o dono da fazenda Marinepar, que mora em Curitiba-PR, e de lá originou a ligação no meu celular pessoal, disse-me em tom intimidativo, como se eu fosse o seu empregado que tivesse feito algo errado: "POR QUE VOCÊ SOLTOU O BANDIDO DO JOSIAS?". Como eu não estava entendendo, ele repetiu: "SÓ QUERO SABER SE O BANDIDO DO JOSIAS ESTÁ OU NÃO EM LIBERDADE?". Respondi então que minha função era a de ser imparcial e que não podia manter a conversa naquele nível. E então ele arrematou: "ISSO NÃO ME INTERESSA, SÓ QUERO SABER SE VOCÊ SOLTOU OU NÃO". Abreviei a Conversa e alertei que não daria informações por telefone.

Como não tinha guardado o nome do indivíduo pedi para um investigador retornar a ligação no outro dia, e que o tal do Ricardo numa prepotência ímpar disse que já tinha marcado uma reunião com o Secretário de Segurança e com o Chefe da Casa Civil, e que o delegado já estaria sob investigação, e finalizou: "ISSO NÃO VAI FICAR ASSIM,VOCÊS MEXERAM COM A PESSOA ERRADA" (conforme está no B.O. que registrei).

No mesmo dia, um advogado, também com uma ligação originada do PR, já que o DDD é 41, no meu celular particular afirmou que era advogado de JOSÉ JAIR, o qual é EX-SECRETÁRIO DE SEGURANÇA PÚBLICA do DF, e que tem uma fazenda vizinha a da Marinepar.

Devido a esses fatos, imediatamente convidei a imprensa local para fazer uma reportagem:

http://topnews.com.br/noticias_ver.php?id=10436

Há que se constar que à Polícia Judiciária cabe a representação pelos mandados de busca, mas o Poder Judiciário concedeu a pedido da PM. A matéria já tinha sido levada ao TJ-MT, e os desembargadores à unanimidade decidiram que isso está certo, a PM pode representar.

Isso é uma afronta ao Estado Democrático de Direito, não é porque sou policial civil, mas se observarmos vivemos em um Estado militarizado em que se abrem perigosos precedentes, mas como eu asseverei no início, o Estado é subserviente.

E só para constar, coincidência ou não, um ex-capitão, que está sendo investigado pela Polícia Civil de Aripuanã, acusado de cometer violência nas demandas de terra, possui uma fazenda vizinha à da Marinepar e a do ex-Secretário de Segurança do DF.

Sugiro que os colegas leiam recente decisão do STF, considerado a ação mais antiga daquela corte, em que a demanda envolve diretamente o Estado do Mato Grosso e a questão agrária. Interessante ler, sobretudo o voto do Ministro Ricardo Lewandowski:

http://stf.jusbrasil.com.br/noticias/3055942/stf-julga-causa-mais-antiga-na-corte-e-mantem-validade-de-alienacao-de-terras-em-mt

Agradeço a todos.

*Mestre em Política Social pela UFMT.

Fonte: sítio da ADUFMAT-SSIND


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